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Saúde

09/07/2020 - 16:02

Prefeito Bruno Covas faz flexibilização do isolamento social sem respeitar recomendações da OMS

Presidente do Sindsep analisa dados oficiais e observa o risco de crescimento incontrolável da transmissão do coronavírus na cidade de São Paulo, em razão da pressão econômica e política.

Por Sérgio Antiqueira, presidente do Sindsep

 

A decisão do Prefeito Bruno Covas por flexibilizar o isolamento social dentre as várias medidas de ataque aos serviços, aos servidores e à população, tem sido uma das mais nocivas, por colocar em risco de morte, população e trabalhadores. Atendendo à pressão de empresários e do governador Doria, liderança com maior força atualmente no seu partido, PSDB, e prestes a entrar no período eleitoral como candidato à reeleição, Covas segue critérios do governo estadual, sem consultar a equipe técnica da Secretaria Municipal de Saúde, e desrespeitando totalmente as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS).

 

Orientações da OMS são claras

 

Segundo informou a Agência Brasil em matéria do repórter Jonas Valente, de 3 de junho, sobre a divulgação, em maio pela OMS, do documento de orientações denominado "Critérios de Saúde Pública para Ajustar Medidas de Saúde Pública e Sociais no Contexto da Covid-19", a definição das regras de distanciamento social pelas autoridades deve levar em consideração alguns parâmetros.

 

1. Se a epidemia está ou não controlada na localidade, devendo-se calcular fórmulas quanto à taxa de reprodução do novo coronavírus, e considerar o tamanho da população e as características de cada local, porém observando alguns indicadores: 

 

a) declínio do número de mortes por, pelo menos, três semanas; 

 

b) queda de, pelo menos, 50% da incidência em um período de três semanas após o pico.

 

2. Se o sistema de saúde do local tem condições de lidar com o ressurgimento dos casos, devendo o número de casos previstos nesta hipótese ser comportado pela estrutura de atendimento.

 

3. Se o sistema de vigilância em saúde consegue testar os casos, rastrear quem teve contato com esses e isolá-los, implicando em ter quantidade necessária de kits de testagem e práticas ágeis de exame da população.

 

4. A OMS recomenda ainda que pelo menos 90% dos contatos sejam isolados até 48 horas após a identificação do caso confirmado e pelo menos 80% dos contatos são monitorados por 14 dias.

 

Critérios descumpridos pelo prefeito

 

A maioria dos critérios, orientados para o relaxamento, não foi atingido pela Cidade de São Paulo:

 

1. Nem os boletins diários da Secretaria Municipal de Saúde e nem o último Relatório Situacional de 29 de maio (o último divulgado) informam a taxa de reprodução do vírus, a qual, para relaxar o isolamento, precisaria estar abaixo de 1. Covas anunciou no final de maio à imprensa que previa que a taxa estaria inferior a 1 na primeira semana de junho, quando iniciou a flexibilização. Segundo os cientistas do Observatório Covid-BR, no final de maio, a quantidade de pessoas contaminadas por caso confirmado da doença despencou no estado de São Paulo após a adoção de medidas de isolamento social, conforme reportagem do G1. Ainda conforme a reportagem, para os pesquisadores "a reabertura do comércio e a volta à vida normal em São Paulo depende de manter a taxa de contágio abaixo de 1 por um longo período". A página do Observatório COVID-19 BR apresenta o número reprodutivo ao longo do tempo, tanto de COVID-19, como de SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) que pode vir a ser confirmada ou não como Covid-19 se testada. Houve uma queda abaixo de 1 ao final de maio, crescendo para próximo e acima de 1 no início de junho, queda no meio e nova subida até o início de julho. Sobre o Plano São Paulo, a página já alertava em 2 de junho que a epidemia no município de São Paulo não estava sob controle no município, apesar das medidas de distanciamento e que era prematuro o relaxamento destas medidas naquele momento, com risco de retomada do crescimento do número de casos na cidade a partir de um patamar já elevado.

 

Imagem: Observatório Covid-19 BR

 

a) Sobre o número de mortes por Covid-19, o gráfico abaixo (com a média diária de óbitos confirmados e suspeitos dos últimos 7 dias) demonstra pela área vermelha que não houve declínio no mês de maio, fosse por duas ou por três semanas seguidas. O mesmo também não se deu em junho quando iniciou o Plano São Paulo de flexibilização, obtendo-se médias ainda maiores que em maio. Os vales e picos refletem as oscilações dos registros diários de óbitos confirmados (em verde) relacionado a lotes de resultados de testes para Covid-19. Os óbitos confirmados de Covid-19 da primeira semana de julho se mantiveram mais alto do que em maio e os casos suspeitos regrediram desde o final de junho. Não havia e ainda não há as condições para a flexibilização do isolamento social.

 

Elaborado pelo Sindsep a partir dos Boletins Diários de SMS

 

b) Quanto à incidência, que corresponde ao número de novos casos de uma doença dividido pelo número de pessoas em risco (não contaminadas), o Relatório Situacional de 29/05/2020 da SMS não faz o acompanhamento do coeficiente de incidência da Covid-19. No entanto, analisam a situação epidemiológica de casos leves (Síndrome Gripal) e casos moderados /graves (SRAG), como forma de conhecer o impacto causado pela Covid-19 na população e dimensionar as necessidades relacionadas à assistência, inclusive de ampliação de leitos hospitalares. Levam em conta os casos de SRAG hospitalizados com projeção estatística. Conforme o Gráfico abaixo, identificaram a tendência de estabilidade da incidência em aproximadamente 600 casos novos por dia, intercalada por picos de incidência até o final de maio. Portanto, ao final de maio, não havia por parte da OMS a condição de queda – de pelo menos 50% na incidência em um período de três semanas após o pico –, que justificasse a medida de flexibilização a partir de junho.

 

Imagem: Relatório Situacional de 29/05/2020 - SMS/PMSP

 

2. Quanto ao sistema de saúde ter condições de lidar com o ressurgimento dos casos, o Relatório de 29 de maio ressalta que se o número de leitos UTI COVID que era de 167 não fosse acrescido gradualmente chegando a 856 em 27/05, dentro de um processo de implantação de 1.007 leitos, o município entraria em colapso, com uma taxa de ocupação de 334 %. Conforme os boletins diários da SMS, a Taxa de Ocupação de Leitos que chega a 91% na metade de maio na cidade é reduzida ao longo das semanas, mas não por redução das internações, mas por ampliação dos leitos nos 20 hospitais municipais e contratação de leitos da rede privada. No entanto, o Relatório de SMS de maio indica estudos de cenários hipotéticos, da previsão de óbitos na cidade, relacionados às medidas de distanciamento social, segundo o qual sem nenhuma intervenção, São Paulo chegaria a 100 mil mortes no final de abril. E no caso de intervenção mantida somente até a primeira quinzena de maio, alcançaríamos até o fim de julho 90 mil mortes. Segundo os técnicos da SMS, nesse caso, "o relaxamento retomaria a trajetória incontrolável da epidemia", e "apenas o fortalecimento das medidas de distanciamento social manteria a estimativa de 10 mil mortes". De fato, nas reuniões de Mesa Técnica da SMS, ficou clara em mais de uma oportunidade que a opinião do corpo técnico da Prefeitura não foi ouvida para a decisão do prefeito de avançar o relaxamento do isolamento social.

 

Gráfico elaborado pelo Sindsep com base nos dados dos Boletins Diários de SMS

 

3. Não há programa ou previsão do sistema de vigilância em saúde constando no relatório da SMS ou em páginas da Secretaria, que apresente a disposição de testar sequer os casos sintomáticos no âmbito da Atenção Básica, com rastreamento de quem teve contato, a fim de garantir o isolamento. Os kits de testagem previstos estão sendo utilizados para testagens de alguns funcionários, sem critérios claros, e pacientes internados. Também foi iniciado um inquérito sorológico iniciado com 5.600 moradores sorteados revelando uma estimativa de quase 1,2 milhão de infectados, cerca de 10% da população. O estudo ajuda a ter informações da prevalência da contaminação na população, mas não serve a um monitoramento das condições para a flexibilização.

 

4. O relatório da SMS afirma que é realizado um monitoramento diário por um período de 14 dias a partir do primeiro atendimento realizado pela Unidade Básica de Saúde (UBS) para acompanhamento dos pacientes sintomáticos respiratórios leves que estão em isolamento domiciliar. Como dito anteriormente, sem testagem. Esse monitoramento, segundo a SMS, se realiza por telefone ou visita domiciliar, podendo o paciente receber alta ou ser encaminhado para um Hospital de Campanha ou de referência em Covid-19 na região. Além de somente estar previsto o acompanhamento de pacientes que procuraram a UBS, não há programa para isolamento de 90% dos contatos em até 48 horas, após a identificação do caso confirmado (uma vez que sequer há testes suficientes). Também não há previsão de monitoramento por 14 dias de, no mínimo, 80% dos contatos. Essa prática não é seguida sequer para os trabalhadores da Prefeitura, que tiveram contato com colega, ainda que confirmado com Covid-19.

 

Isolamento social salvou São Paulo até agora

 

A Prefeitura praticamente não cumpriu nenhum dos critérios orientados pela OMS, que dessem condições e garantias para uma reabertura das atividades, flexibilizando medidas e comportamento de isolamento e distanciamento social. Até que se tenha uma vacina eficaz com ampla distribuição, a única proteção, especialmente para a população idosa, com comorbidades e mais pobre, é o isolamento e distanciamento social.

 

A cidade de São Paulo corre o risco de ter um crescimento incontrolável da transmissão, como indicam os especialistas e sugerem os técnicos da própria Secretaria Municipal de Saúde, conforme o último relatório publicado em maio. Se São Paulo ainda está com números controlados, em parte podemos supor que seja por conta do isolamento, que até o início de julho não teve queda expressiva como mostram os dados disponíveis nas páginas do Governo do Estado de São Paulo e da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE). Ao analisar os dados dos 10 municípios do estado de São Paulo com maior número de óbitos por 100 mil habitantes, quanto à evolução no tempo tanto do número de óbitos como do índice de adesão ao isolamento social, vemos que São Paulo (linha vermelha) é o município que se manteve com maior índice de isolamento social e até crescendo o índice a partir da metade de maio enquanto os demais flexibilizaram nesse período. Os números desses nove municípios estão indicados por linhas em tons de rosa (municípios com mais de 500 mil habitantes), verde (entre 200 mil e 500 mil habitantes) e azul (entre 100 mil e 200 mil). É visível que as curvas de óbitos por Covid-19 de todos estes municípios, exceto Caieiras, tiveram inclinação maior que São Paulo, sugerindo a relação entre adesão ao isolamento social e número das mortes por Covid-19, o que mereceria um estudo estatístico.

 

O fato é que São Paulo, ao adotar medidas de flexibilização para responder a pressões políticas e econômicas irracionais, pode mudar o comportamento da população, levando ao crescimento das mortes, expondo ainda mais a população idosa, de risco e mais pobre. E conforme for afrouxada a adesão ao isolamento social, não se deve descartar o retorno do risco do colapso do sistema de saúde.

Elaborado pelo Sindsep com base em dados do Seade

 

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