Mulheres

A pandemia de coronavírus e as mulheres

26/03/2020 18:52

Município não indica preocupação de gênero nem mesmo no texto do decreto de Situação de Emergência na cidade de São Paulo
 
 
A pandemia do novo coronavírus (que causa a doença infecciosa Covid-19) gerou por parte da Prefeitura de São Paulo o Decreto 59.283, de 16 de março de 2020, para tentar conter o número de casos que se espalham pela cidade. No entanto, teoria e prática não comungam. Faltam equipamentos de proteção individual, planejamento e preparo responsável da gestão para executar o que se propõe no papel (decreto). E se observarmos a dimensão de gênero, o decreto simplesmente desconsidera a questão.
 
Impactos sobre as mulheres
 
Se é verdade que a pandemia atinge a todos, também é fato que as mulheres em geral estão na linha de frente do cuidado. São elas majoritariamente que cuidam de crianças e idosos, dessa forma assumem custos físicos e emocionais, portanto, mais riscos. No serviço público são também as mais expostas.
 
Sabemos que a maioria dos/as trabalhadores/as da Prefeitura de São Paulo são mulheres, então não se pode negar a especificidade de gênero no problema, ainda que não fôssemos maioria. 
 
As trabalhadoras do setor de saúde, trabalhadoras domésticas, mulheres que estão na economia informal, refugiadas, migrantes são mais expostas ao coronavírus e precisam de uma atenção especial. Elas devem ser envolvidas nas tomadas de decisão dos poderes local, estadual e nacional. 
 
Essa inclusive é uma recomendação da Organização das Nações Unidades (ONU) Mulheres para as Américas e Caribe por meio da publicação “Covid-19 na América Latina e no Caribe: como incorporar mulheres e igualdade de gênero na gestão da resposta à crise”, divulgada no último dia 17 de março.
 
Segundo o documento, garantir a dimensão de gênero na resposta requer alocação de recursos suficientes para responder às necessidades de mulheres e meninas, promover consultas diretas com organizações sobre as situações das mulheres e as medidas apropriadas para enfrentar a pandemia. 
 
A ONU Mulheres recomenda ainda incluir nas taxas, índices diferenciados de infecção, impactos da carga econômica e de assistência, barreiras de acesso das mulheres para a sobrevivência e a incidência de violência doméstica e sexual, além de assegurar que as necessidades imediatas das mulheres que trabalham no setor de saúde sejam prontamente atendidas. É fundamental escutar a demanda de gênero destas profissionais, fornecer equipamentos de proteção suficientes para a sua segurança, bem como acolhimento das dificuldades na medida dos acontecimentos, como, por exemplo, estratégias e recursos para o cuidado dos filhos de quem é mãe e não pode deixá-los nas escolas ou com os avós. 
 
 
Mulheres em geral estão na linha de frente do cuidado e com isso assumem mais riscos. | Foto: Agência Brasil
 
"A Covid-19 tem impactos e implicações diferentes para mulheres e homens". No entanto, “as mulheres são essenciais na luta contra a pandemia, sejam elas socorristas, profissionais de saúde, voluntárias da comunidade e prestadoras de cuidados”.
 
Nesse sentido, a decretação de Situação de Emergência em São Paulo traz medidas importantes para tentar conter o vírus, mas nenhuma que considere esse aspecto fundamental. 
 
 
Responsabilidade do cuidado
 
Devido ao acúmulo de demandas, exaustão do sistema de saúde e fechamento das escolas, as mulheres que, em geral, assumem a responsabilidade do cuidado na família, ficam ainda mais sobrecarregadas e sob tensão. Se pensarmos na trabalhadora da saúde municipal, há um agravamento do cenário, por se somar à demanda caótica na saúde diante da pandemia.
 
Os danos físicos e psíquicos, bem como os riscos são maiores. Seria sensato, portanto, que a gestão municipal ouvisse as mulheres e suas representantes, e dialogasse com elas, tanto na produção e análise de dados quanto na construção de medidas. 
 
Em nossa realidade social, devido às desigualdades de gênero, raça e classe, a epidemia do coronavírus agrava a vida das pessoas mais vulneráveis no sistema, como mulheres, negros/as e pobres. Até o momento se discute as formas de prevenção a partir da classe média, pouca ou nenhuma consideração sobre a maioria dos/as trabalhadores/as que vivem em péssimas condições de vida e de trabalho nas periferias das grandes e médias cidades. Como fica, por exemplo, a mulher que mora com seis, oito ou mais pessoas, e que não tem água em sua comunidade e nem sabão para a higienização?
 
Diferença de classe
 
A primeira mulher que morreu no Brasil, em decorrência do Covid -19, é uma empregada doméstica do Rio de Janeiro e contraiu o vírus da patroa que havia voltado de viagem ao exterior. A imprensa não divulgou seu nome, apenas que tinha 63 anos e as políticas de seguridade social não a protegeram. Com essa idade, ela deveria estar aposentada. As regras anteriores já penalizam grupos de trabalhadores/as, como as mulheres, especialmente domésticas, com a epidemia isso se complica ainda mais.
 
Queremos te ouvir
 
O Sindsep, por meio da Secretaria da Mulher Trabalhadora, quer trazer à tona essas questões e ouvir as mulheres dos setores que estão na linha de frente para conter a pandemia. Colocamos à disposição os canais de escuta e diálogo para tentar atender essas demandas e cobrar ações do prefeito e gestores envolvidos.
 
 
Coletivo de Mulheres Trabalhadoras do Sindsep-SP