15/08/2017 18:02
Setembro é o mês da prevenção ao suicídio. Neste mês, o tema é discutido bastante, sob as mais diversas óticas, mas muitas vezes se esquece de abordar um elemento fundamental: o trabalho.
Discutir o trabalho e sua relação com a saúde mental se torna ainda mais necessário agora, com a aprovação da deformante Reforma Trabalhista, que intensifica a fragilização dos vínculos de trabalho, ou seja, aumenta a possibilidade se ficar sem emprego e reduz a estabilidade de vida dos trabalhadores.
No serviço público a estabilidade encontra-se ameaçada, por exemplo, por projetos de lei que procuram facilitar os processos de exoneração e terceirização. Um deles é o PL 00126/2017, de Holiday (DEM), que prevê auditoria do trabalho dos servidores, sem considerar sua realidade ou particularidades.
Na nossa sociedade o trabalho ocupa papel central, sendo garantidor de nossa sobrevivência, construindo e transformando nossas identidades (quão comum é, ao nos apresentarmos, dizermos nossas profissões em seguida de nossos nomes?) e frequentemente nos conferindo valor em nossa sociedade.
Estar excluído do trabalho significa estar à margem em um sistema que, infelizmente, nos avalia por nosso valor produtivo e econômico apenas, o que gera medo e angústia àqueles colocados diante da possibilidade do desemprego. Este medo facilita que trabalhadores se submetam a condições precárias e perigosas de trabalho, que prejudicam nossa saúde em sua totalidade.
No serviço público, não é incomum vermos trabalhadores aceitarem diversos tipos de agressão por medo de, caso peçam ou sofram exoneração, não se recolocarem no mercado. Esse medo tende a se intensificar em pessoas de grupos já frequentemente excluídos do mercado, como pessoas negras, mulheres e pessoas LGBT.
Para além do medo do desemprego, o sucateamento e a precarização das condições de trabalho, frequentemente acompanhadas de terceirizações, é capaz de produzir intenso sofrimento, roubando nossas ações e atividades de significado, esvaziando nossas vidas laborais e instalando um cenário de profundo desgaste. Sentimos-nos completamente exaustos e sem saída à vista.
É nesse cenário que surgem os adoecimentos mentais. Quando nada mais que fazemos é capaz de sustentar nosso cotidiano de trabalho, instalam-se quadros depressivos, de burnout, estresse pós-traumático e drogadição. Isso se soma a discursos culturais que enaltecem a excelência e o serviço privado e que atribuem toda responsabilidade de sucesso dos serviços e da vida aos indivíduos, desconsiderando as condições e organizações do trabalho, alimentando sentimentos de culpa e autodepreciação.
Esse sofrimento pode se intensificar também ao considerarmos que, no serviço público, é frequente que os trabalhadores se encontrem emocionalmente engajados aos resultados de seu trabalho, desejando oferecer acesso a direitos com qualidade. O pesquisador Jackson-Filho (2015), por exemplo, constata que o serviço público possui trabalhadores altamente engajados, mas constantemente frustrados por impedimentos institucionais sistemáticos às suas atividades, deteriorando sua saúde.
Para agravar a situação ainda mais, não é incomum que aqueles servidores que adoecem sejam submetidos a procedimentos periciais humilhantes e discriminatórios, que os tratam como simuladores e preguiçosos.
O desespero produzido por essas situações pode levar uma pessoa a contemplar o suicídio, não vendo mais sentido em seu trabalho e em sua vida, estando profundamente angustiada e amedrontada.
É necessário que essas pessoas possam ter alternativas e esperança. É importante que seja reconhecido o papel do processo de trabalho na produção de seu sofrimento e é fundamental que esse possa ser transformado para que ela e outros não precisem defrontar-se com ideias tão avassaladoras.
A luta por um serviço público de qualidade, por condições de trabalho adequadas, por voz na construção dos processos de trabalho, por relações mais humanitárias entre chefias, colegas e usuários, é, portanto, também uma luta pela vida. Quando participamos de atividades sindicais e de movimentos sociais que defendem os sistemas públicos, participamos da construção de uma sociedade mais saudável.
A prevenção do suicídio precisa considerar todos os elementos que compõem sua ideação e tentativas, desde características individuais, até fatores sociais, culturais e econômicos.
Se você está percebendo que seu trabalho está te gerando sofrimento, procure ajuda. Você pode, por exemplo, recorrer aos Centros de Referência à Saúde do Trabalhador, que contam com profissionais aptos a discutirem os impactos do trabalho na saúde. Há também na Clínica Ana Maria Poppovic, em São Paulo, o projeto da Clínica do Trabalho, nos quais os atendimentos psicológicos olham cuidadosamente para essas questões.
Caso você decida procurar por um atendimento clínico individual, procure prestar atenção na maneira com a qual o profissional encara o trabalho e se ele reconhece seu relevante papel no processo saúde-doença.
Lembre-se: você não está sozinho ou sozinha. O sindicato está aqui para apoiar os trabalhadores em busca de saúde em seus locais de trabalho. Entre em contato conosco através do telefone (11 2129-2999) ou do e-mail ([email protected]).
Quer entender um pouco mais sobre a relação entre saúde e trabalho no serviço municipal? Peça nossa revista sobre o tema para o diretor da sua região ou baixe ela online em nosso site.