Saúde

Sindicato inicia ciclo de debates sobre a saúde pública na pandemia e pós-pandemia

17/06/2020 18:18

Médico infectologista antevê a possibilidade de um colapso no Estado de São Paulo.

O Sindsep iniciou na noite de terça (16) um novo ciclo de debates “Saúde pública brasileira na pandemia e pós-pandemia”. Na estreia, o médico infectologista do Hospital Emílio Ribas, Eder Gatti, diretor e ex-presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp) e o advogado, coordenador nacional da Central de Movimentos Populares (CMP) e membro da Coordenação da Frente Brasil Popular, Raimundo Bonfim, debateram a “Flexibilização do isolamento social na atual situação da pandemia”.
 
Lourdes Estêvão, secretária de Trabalhadores da Saúde do Sindsep, que mediou o diálogo pontuou que os governos Covas/Doria esquecem de informar a população, ao citarem porcentagens de UTIs disponíveis, que mesmo com leito e respirador mais de 10 mil foram a óbito em São Paulo. “Eles liberam a abertura do comércio por pressão dos empresários, mas também liberam covas nos cemitérios. Tanto Doria quanto Covas diferem pouco de Bolsonaro”, comparou a dirigente.
 
Isolamento social minimiza avanço da pandemia
 
Na avaliação de Eder Gatti, médico infectologista do Hospital Emílio Ribas e ex-presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp), a Covid-19 escancarou muitos problemas do modelo político ultraliberal, que colocariam o Brasil em situação ainda mais grave, caso não existisse o Sistema Único de Saúde (SUS). “O Estado brasileiro foi enfraquecido, perdeu muito a sua capacidade de gestão, que está demonstrado no bate-cabeça dos gestores. O governo foi enxugando, enxugando, e se distanciando da vida das pessoas. Há um discurso muito liberal nos últimos anos e acreditar que o mercado vai regular as coisas só intensificará os problemas”, alertou.
 
Para ele, a flexibilização do isolamento social é um erro, por se tratar de uma doença que não tem remédio. “O mundo inteiro fez, menos a Bielorrússia, talvez. O isolamento social é muito duro, mas diminui a doença. Na primeira fase do isolamento social, a falta de coordenação dos estados, município e governo federal foi o que prejudicou, com a figura do presidente da República dando péssimos exemplos. Faltou um discurso único entre os governantes. Embora no estado de São Paulo houvesse o discurso em favor do isolamento, não houve estímulo para que isso, de fato, ocorresse. O discurso em hashtag ‘fique em casa’ é fácil para quem tem casa, Netflix, salário, mas não para quem estava desempregado – e antes da pandemia já havia no Brasil 12 milhões de desempregados. Não houve apoio financeiro para as famílias mais pobres”, disse, ao criticar as aglomerações geradas para receber o auxílio-emergencial de R$ 600, que não chegaram a muitas pessoas, assim como as cestas básicas.
 
A falta de renda da maioria da população foi um dos motores para que houvesse um isolamento social “pela metade”, afirmou Gatti. “A desmotivação foi feita pelos próprios governos em São Paulo e no nível federal. Não por acaso se registra 44 mil mortes no Brasil e São Paulo já passou de 10 mil”.
 
"Covas abriu mais covas do que leitos"
 
O coordenador nacional da Central de Movimentos Populares, Raimundo Bonfim, concorda com o infectologista. Para o advogado, que também integra a Coordenação da Frente Brasil Popular, a pandemia evidenciou a grande desigualdade no país. “Temos um discurso irresponsável do presidente Jair Bolsonaro, que incentiva quem poderia ficar mas não fica, e 70%, 80% que não tem renda para ficar em casa por uma semana. Não basta fazer decreto se os governos não derem apoio a essas famílias para que elas se mantenham em casa”, analisou.
 
Bonfim defende uma renda correspondente a um salário mínimo para todos, de forma permanente, para enfrentar a pandemia. “Chegamos a três meses de pandemia, sem EPI, preparação de hospitais, testagem, vários adoecimentos e óbitos, mas mesmo assim se retoma as atividades. 
 
Na avaliação do coordenador da CMP o governo João Doria só fez um decreto de isolamento social e o governo Covas “abriu mais covas do que leitos para poder superar essa situação”.
 
Gatti antevê a possibilidade de um colapso no Estado de São Paulo. “Estamos longe da imunidade de rebanho e isso trará consequências que veremos no futuro: aumento da pobreza, recessão, violência, colapso econômico, agravamento do colapso de políticas públicas. Há uma queda na cobertura vacinal, queda de retirada de medicamentos para HIV/Aids, aumento de tuberculose. Muitos problemas sociais, pelo colapso econômico e político”.
 
"Não há salvação para o povo se não tirarmos Bolsonaro"
 
Para evitar a barbárie, segundo o médico, é preciso o fortalecimento do Estado brasileiro. “Será preciso o fortalecimento do SUS. Desenhar políticas públicas por territórios. A Atenção Primária na saúde pública vai ter que ganhar uma importância maior, que já poderia ser utilizada no rastreamento de comunicantes e identificação de casos de Covid-19. Terá que haver a intersetorialidade das políticas públicas”, pontua.
 
Bonfim acrescentou a necessidade de unidade da classe trabalhadora, em razão de que “em tempos de crise, o capitalismo avança mais sobre os trabalhadores”. “Teremos que fazer uma grande luta por emprego e renda. Precisamos taxar as grandes fortunas. Todos têm direito a uma moradia digna, ao SUS fortalecido e educação de qualidade. É preciso também vincular nossas pautas à luta contra o racismo e fascismo. Não há salvação para o povo se não tirarmos o governo Bolsonaro, para voltar a respirar, em defesa dos serviços públicos e das políticas públicas”.
 
Fortalecimento do Estado
 
A engenheira agrônoma e servidora pública, Cyra Malta, também falou no debate sobre a relação do modelo de produção dos alimentos na influência das pandemias. Já Erivalder Guimarães, da Covisa, desmentiu a notícia de ter se alcançado o platô da curva de ascendência da doença em São Paulo. “Dizem que tivemos um platô da curva. Do dia 8 para cá tem uma curva ascendente. Daqui a 15 dias teremos um aumento de casos e daí para retomar o estágio de abril será muito difícil”, salientou.
 
O presidente do Sindsep, Sérgio Antiqueira, falou sobre a falta de transparência nos registros oficiais, incluindo a queda de leitos ocupados que, segundo o governo Covas, caiu de 92% para 63%. 
 
O secretário de Imprensa do Sindsep, João Batista Gomes, defendeu a reabertura pela administração municipal de hospitais que estão abandonados em São Paulo, como o Sorocabano, na Lapa, e a condução do Estado nas políticas públicas. “O governo Covas está querendo retomar o Projeto de Lei 749 que extingue serviços públicos – diversas Autarquias e Fundações, entre elas a Autarquia Hospitalar Municipal, o Serviço Funerário e a Fundação Theatro Municipal, e cria duas novas agências reguladoras”.
 
A saúde mental na pandemia e no pós-pandemia, a pandemia como resultado da relação destrutiva do homem com o meio ambiente e a pressão no trabalho em áreas essenciais da saúde também foram abordadas no debate sobre a flexibilização do isolamento social.