Saúde

Terceirizar faz mal à Saúde: Gestão Ricardo Nunes favorece Cejam em contratação irregular na zona sul

27/10/2022 10:00

INTS, OSS responsável pelo escândalo de reutilizar pinças em exames de endoscopia no Hospital de Santo Amaro foi penalizada, mas Secretaria Municipal de Saúde ainda tem muito o que explicar, como o processo direcionado de substituição da OSS nos 61 equipamentos de saúde da região sul.

Por Cecília Figueiredo, Sindsep



 

O Ministério Público de São Paulo vai pedir esclarecimentos à Secretaria de Saúde da Prefeitura de São Paulo a respeito de denúncia encaminhada por representantes do Conselho Municipal de Saúde sobre suposto favorecimento da organização social CEJAM (Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”) para assumir a gestão do Hospital Municipal Integrado de Santo Amaro (HISA), na zona sul. A informação foi confirmada por mensagem, nesta quarta (26,) pela promotora de Direitos Humanos Dora Martin Strilicherk. 
 
O Hospital Municipal Integrado de Santo Amaro era gerenciado, desde novembro de 2020, pelo Instituto Nacional de Tecnologia e Saúde (INTS), responsável por uma série de infrações, “reprocessamento de pinças de endoscopia, lançamento de exame não regulado e exames não existentes”, conforme citou a promotora.
 
As irregularidades, como o reaproveitamento de pinças em exames de endoscopia, foram descobertas por uma auditoria do Ministério Público de São Paulo provocada por munícipes e conselheiros. Constatou-se a compra de 3.085 pinças para a realização de 19.602 exames no período analisado. 
 
No relatório do MPSP constam outras irregularidades cometidas pela OSS gestora, como laudos sem assinatura do profissional responsável; uso de sedativos potentes, como proporfol sem a presença do médico anestesista no local; e ausência da captura de imagens dos exames. Um documento do Tribunal de Contas do Município (TCM), encaminhado ao MP e à administração, reforçou à época a necessidade de devolução do dinheiro aos cofres públicos.
 
A pressão fez a Secretaria de Saúde penalizar as duas empresas envolvidas nas infrações, One Laudos (contratada pela INTS para processamento dos diagnósticos) e INTS a devolver aos cofres públicos cerca de R$ 5 milhões referentes aos exames e o cancelamento em contratação no município por 2 anos. Embora, esse processo não tenha tido o acompanhamento de representações dos trabalhadores e da população, o que impede o controle social que é uma das diretrizes do SUS.

 

 Contrato da Prefeitura de SP com INTS incluía a gestão de 61 equipamentos de saúde da região sul. | Fotos: INTS
 
Ocorre que além dos mais de 20 mil pacientes que passaram por exames de endoscopia com pinças reutilizadas, há outros prejuízos apontados por conselheiros do município e que não constam da auditoria. “Foram desviados R$ 4 milhões apenas em endoscopia pela One Laudos, os demais exames realizados no HISA não foram auditados. O HISA faz mensalmente 14 mil ultrassonografias, 702 mamografias, 2 mil endoscopias e colonoscopias, raio-x livre demanda e 800 mapa holter, entre outros”, diz um conselheiro municipal.
 
Os problemas do HISA vão além e não foram sanados. Não há licença para funcionar como hospital, AVCB [Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros], Registro no CREMESP, alvará de funcionamento. "Existe um conjunto de irregularidades no HISA que o Conselho Municipal de Saúde precisa se debruçar para analisar”, elenca o representante.
 
No entanto, nada disso é prioridade para o governo do prefeito Ricardo Nunes. Afinal, frente ao cancelamento do contrato com a INTS, responsável pela gestão do HISA, a Secretaria Municipal de Saúde correu para favorecer uma outra organização social na gestão do serviço, o que motivou o conselheiro a apresentar nova denúncia ao MPSP.
 
Em setembro, o MP havia recomendado à Secretaria Municipal de Saúde a interrupção da sessão pública, marcada para 20/09/2022, e da análise das habilitações e prolação da decisão de punição do INTS. Em atendimento, a sessão pública foi prorrogada para o dia 9/11/2022, no entanto apenas em 18/10/2022, foi publicada em DOC a punição à OSS. “Um dia antes, a Coordenadoria Regional de Saúde Sul chamou todos os gerentes dos serviços gerenciados pela INTS para informar que a OSS estava sendo impedida de continuar com o contrato emergencial e que o CEJAM assumiria um novo contrato emergencial por 180 dias e que haveria uma transição tranquila entre as duas instituições”, chama a atenção o conselheiro.
 
Na reunião, foi alegado que o CEJAM assumiria os equipamentos de saúde, antes gerenciados pela INTS, por ter ficado em 2º lugar no chamamento emergencial de 2020.
 
“Nos dias 18/10/2022 e 19/10/2022, as respectivas supervisões técnicas de saúde de Santo Amaro e Cidade Ademar, informaram aos conselhos gestores que o CEJAM iria assumir [os serviços antes gerenciados pelo INTS] o território em um contrato emergencial com prazo de 180 dias a contar do dia 24/10/2022”, cita outro trecho da denúncia encaminhada ao MP. 
 
Após a comunicação é que a Secretaria de Saúde vai perguntar à Coordenadoria Jurídica da Prefeitura de São Paulo sobre a possibilidade de contratação de uma nova organização por tempo determinado, com dispensa de licitação, para substituir todos os contratos no território Sul antes assumidos pela INTS. No mesmo dia 20, no início da noite, o secretário municipal de saúde solicita encaminhamento de consulta a todas as organizações que mantêm contrato com a municipalidade sobre a disposição de participar da consulta pública, iniciada às 11h do dia 21 de outubro.
 
O volume de documentos e exigências feitas pela Secretaria de Saúde, como “plano de trabalho”, que deveriam ser encaminhados até o final do dia 21 evidencia para o conselheiro que houve um favorecimento do Poder Público ao Cejam.
 
“Tenho absoluta convicção que o cidadão não pode ser impactado negativamente por ações ou omissões da administração pública, no entanto penso que a impessoalidade, moralidade, probidade, razoabilidade e publicidade são princípios que não devem ser suprimidos, e a SMS ao divulgar o nome do Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim” – CEJAM, mesmo sem ter dado oportunidade às demais organizações apresentarem proposta que poderia ser mais vantajosa para a municipalidade”.
 
O conselheiro critica ainda, na denúncia encaminhada ao MPSP, a qualidade do serviço prestado pela OSS CEJAM, pagamento de supersalários a diretores, conforme já apontado pela Promotoria, e manutenção de “contratos com empresas cujo quadro societário são grupos de investimento com sede em paraísos fiscais”.
 
POSIÇÃO DO SINDSEP
 
“Já ficou mais do que provado que a prática de organizações sociais que invadiram as políticas públicas como Educação, Cultura, Assistência e Saúde só tem um objetivo: fazer mal à vida da população e à saúde financeira da administração pública. Não há benefícios nem na qualidade dos serviços, muito menos na ampliação do atendimento”. A crítica foi feita pela secretária de Trabalhadoras/es da Saúde do Sindsep, Flavia Anunciação, que integra também o Conselho Municipal de Saúde.
 
Segundo a dirigente, o caso será analisado no Conselho Municipal de Saúde e o Sindsep continuará acompanhando as denúncias de desvio de recursos públicos do SUS para empresas privadas e oferta de serviços de péssima qualidade ao cidadão.